Os jogos e as lojas
No dia 1º de Abril, a Ubisoft desligou os servidores de um jogo de corrida online lançado em 2014 chamado “The Crew” e também removeu a possibilidade de alguém comprar o jogo nas suas lojas virtuais. No jogo, que algumas pessoas chamaram de um CARPG (uma concatenação das palavras CAR e RPG), você monta seu carro e cumpre missões para conseguir recursos para melhorar seu veículo.
Uma das inovações para o estilo foi seu caráter exclusivamente online, algo incomum em jogos de corrida. Mas essa semana a Ubisoft conseguiu novamente inovar usando seu jogo de 2014.
Após o desligamento dos servidores, a Ubisoft começou o processo de deletar as licenças dos usuários de suas lojas virtuais e desinstalar o jogo dos seus computadores. E sim, essas lojas de jogos online como a Steam, a Epic Games e outras tem capacidade de instalar e remover os jogos do seu computador. Abaixo uma tabela com trechos dos termos de uso das lojas:
Informações extraídas das lojas virtuais de jogos:
Loja | Termo de uso |
Steam | “Os conteúdos e serviços são licenciados, não vendidos.” |
Epic | O Software é licenciado, não vendido para você dentro da Licença. A Licença não concede a você nenhum título ou propriedade no software.” |
Ubisoft Store | “Se um Produto Ubisoft fornecido for ou incluir um software (“Software“), esse Software constituirá uma licença restrita e sem exclusividade (e não acarretará a venda do Software para você).” |
PlayStation Store | “Isto significa que você pode usar um Produto nas formas descritas na licença, mas não é proprietário dele.” |
GOG* | “Aqui você não será impedido de acessar os títulos que comprou, nem será constantemente solicitado a provar que os possui – este é um jogo livre de DRM.” |
*Apesar da GOG ter um termo de uso melhor que os outros, ainda assim não garante propriedade sobre o título comprado.
Se comprar não é possuir, piratear não é roubar
A frase acima (retirada de um texto do Cory Doctorow) resume o sentimento de todo jogador de “The Crew” nessas últimas semanas, quando clicaram no botão “Comprar” na loja da Ubisoft achavam que estavam comprando o jogo, não uma licença para acessar o jogo enquanto a Ubisoft desejasse.
Os valores que pagamos nos jogos, especialmente os chamados de AAA, são compatíveis com os valores de quando comprávamos em mídia física o jogo para nossos vídeo-games e computadores. Mas é uma ilusão acreditar que as lojas virtuais somente mudaram o meio de entrega da mídia física para a internet, elas mudaram a relação de propriedade.
Hoje você não pode emprestar um jogo comprado na sua loja online favorita para seu amigo jogar e conhecer. Hoje, em muitas das lojas você não pode instalar o jogo em duas máquinas diferentes para jogar, mesmo que as duas sejam suas. E agora sabemos que hoje, em pelo menos uma loja, o verdadeiro dono do jogo pode simplesmente te impedir de jogá-lo quando bem entender.
E essa não é uma realidade somente do mundo dos jogos, toda a indústria do entretenimento migrou para plataformas similares onde você paga para ter acesso ao conteúdo, mas nunca para se tornar proprietário do conteúdo.
Esses serviços online, foram um duro golpe na pirataria, pois são uma alternativa muitas vezes mais acessível e mais cômoda para o produto que queremos, respeitando os direitos autorais. Mas junto com isso sacrificamos a possibilidade de termos propriedade sobre aquela música, filme ou jogo, e talvez, essa possibilidade faça com que a pirataria volte a crescer.
O que a Ubisoft fez com The Crew, o que a Warner fez com seus títulos, o que a Sony fez com títulos da Discovery, é o que todas essas empresas são capazes de fazer com o conteúdo que você gosta. Então, quando gostar realmente de algo, encontre uma forma de remunerar o criador daquele conteúdo – e depois encontre uma forma de pirateá-lo para garantir que nenhuma empresa vai sumir com ele.